De acordo com o Evangelho segundo o
espiritismo, “A censura de conduta
alheia pode ter dois motivos: reprimir o mal, ou desacreditar a pessoa cujos
atos criticamos. Este último motivo jamais tem escusa, pois decorre da
maledicência e da maldade. O primeiro pode ser louvável, e torna-se mesmo um
dever em certos casos, pois dele pode resultar um bem, e porque sem ele o mal
jamais será reprimido na sociedade. Aliás, não deve o homem ajudar o progresso
dos seus semelhantes? Não se deve, pois, tomar no sentido absoluto este
princípio: “Não julgueis para não serdes julgados”, porque a letra mata e o
espírito vivifica.”
Há um texto ditado por Néio Lúcio, no livro
Jesus no Lar, psicografado por Chico Xavier, que fala de um juiz que descobriu
pela dor que, a única autoridade legítima, aos olhos de Deus, é a que se apóia no bom
exemplo. Eis a estória:
Como houvesse o Senhor recomendado nas
instruções do dia muita cautela no julgar, a conversação em casa de Pedro se
desdobrava em derredor do mesmo tema.
- È difícil não criticar – comentava
Mateus, com lealdade -, porque, a todo instante o homem de mediana educação é
compelido a emitir pareceres na atividade comum.
- Sim – concordava André, muito franco -,
não é fácil agir com acerto, sem analisar detidamente.
Depois de vários depoimentos, em torno do
direito de observar e corrigir, interferiu Jesus sem afetação:
- Inegavelmente, homem algum poderá cumprir
o mandato que lhe cabe, no plano divino da vida, sem vigiar no caminho em que
se movimenta, sob os princípios da retidão. Todavia, é necessário não inclinar
o espírito aos desvarios do sentimento, para não sermos vitimados por nós
mesmos.
Seremos julgados pela medida que aplicarmos
aos outros. O rigor responde ao rigor, a paciência à paciência, a bondade à bondade...
E, transcorridos alguns instantes, contou:
- Quando Israel vivia sob o governo dos
grandes juizes, existiu um magistrado austero e violento em destacada cidade do
povo escolhido, que imprimiu o terror e a crueldade em todos os serventuários
sob sua orientação. Abusando dos poderes que a lei lhe conferia, criou
ordenações tirânicas para a punição das mínimas faltas. Multiplicou
infinitamente o número dos soldados, edificou muitos cárceres e inventou
variados instrumentos de flagelação.
O povo, asfixiado por estranhas proibições,
devia movimentar-se debaixo de severa fiscalização, qual se fora rebanho de
bravios animais.
Trabalharia, descansaria e adoraria o
Senhor, em horas rigorosamente determinadas pela autoridade, sob pena de sofrer
humilhantes castigos, nas prisões, com pesadas multas de toda espécie.
Se bem mandava o juiz, melhor agiam os
subordinados, cheios de natural malvadez.
Assim foi que, certa feita, dirigindo-se o
magistrado, alta noite, à casa de um filho enfermo, foi aprisionado, sem qualquer
consideração, por um grupo de guardas bêbados e inconscientes que o conduziram
a escura enxovia que ele mesmo havia inaugurado, semanas antes. Não lhe valeram
a apresentação do nome e as honrosas insígnias de que se revestia. Tomado por
terrível ladrão, foi manietado, despojado dos bens que trazia e espancado sem
piedade, afirmando os sentinelas que assim procediam, obedecendo às instruções
do grande juiz, que era ele próprio.
Somente no dia imediato foi desfeito o
equivoco, quando o infeliz homem público já havia sofrido a aplicação das penas
que a sua autoridade estabelecera para os outros.
O legislador atribulado reconheceu, então,
que era perigoso transmitir o poder a subalternos brutalizados e ignorantes,
percebendo que a justiça construtiva e santificante é aquela que retifica
ajudando e educando, na preparação do Reinado do Amor entre os homens.
Desde a singular ocorrência, a cidade
adquiriu outro modo de ser, porque o juiz reformado, embora prosseguisse atento
às funções que lhe competiam, ergueu, sobre o tribunal, a beneficio de todos, o
coração de pai compreensivo e amoroso.
Lá fora, brilhavam estrelas, retratadas nas
águas serenas do grande lago. Depois de longa pausa, o Mestre concluiu:
- Somente aquele que aprendeu intensamente
com a vida, estudando e servindo, suando e chorando para sustentar o bem, entre
os espinhos da renúncia e as flores do amor, estará habilitado a exercer a
justiça, em nome do Pai.
Bibliografia:
O Evangelho Segundo o
Espiritismo. Allan
Kardec. Tradução de Herculano Pires. Edição 64°. São Paulo, 2007. Editora: Lake.
JESUS NO LAR.
Francisco Cândido Xavier. Ditado pelo Espírito: Neio Lúcio. Publicado
originalmente em 1950 pela. FEB – Federação Espírita Brasileira.
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