O Dever de um maçom.
O dever é o conjunto das prescrições da lei moral, a
regra pela qual o homem deve conduzir-se nas relações com seus semelhantes e
com o Universo inteiro. Figura nobre e santa, o dever paira acima da
Humanidade, inspira os grandes sacrifícios, os puros devotamentos, os grandes
entusiasmos. Risonho para uns, temível para outros, inflexível sempre, ergue-se
perante nós, apontando a escadaria do progresso, cujos degraus se perdem em
alturas incomensuráveis.
O dever não é idêntico para todos; varia segundo nossa
condição e saber. Quanto mais nos elevamos tanto mais a nossos olhos ele
adquire grandeza, majestade, extensão. Seu culto é sempre agradável ao virtuoso
e a submissão às suas leis é fértil em alegrias íntimas, inigualáveis.
Por mais obscura que seja a condição do homem, por mais
humilde que pareça a sua sorte, o dever domina-lhe e enobrece a vida, esclarece
a razão, fortifica a alma. Ele nos traz essa calma interior, essa serenidade de
espírito, mais preciosa que todos os bens da Terra e que podemos experimentar
no próprio seio das provações e dos reveses. Não depende de nós desviar os
acontecimentos, porque o nosso destino deve seguir os seus trâmites rigorosos;
mas sempre podemos, mesmo através de tempestades, firmar essa paz de
consciência, esse contentamento íntimo que o cumprimento do dever acarreta.
Todos os Maçons Plenos (Espíritos superiores) têm profundamente
enraizado em si o sentimento do dever; é sem esforços que seguem a própria
rota. É por uma tendência natural, resultante dos progressos adquiridos, que se
afastam das coisas vis e orientam os impulsos do ser para o bem. O dever
torna-se, então, uma obrigação de todos os momentos, a condição imprescindível
da existência, um poder ao qual nos sentimos indissoluvelmente ligados para a
vida e para a morte.
O dever oferece múltiplas formas: há o dever para
conosco, que consiste em nos respeitarmos, em nos governarmos com sabedoria, em
não querermos e não realizarmos senão o que for útil, digno e belo; há o dever
profissional, que exige o cumprimento consciencioso das obrigações de nossos
encargos; há o dever social, que nos convida a amar os homens, a trabalhar por
eles, a servir fielmente ao nosso país e à Humanidade; há o dever para com
Deus... O dever não tem limites. Sempre podemos melhorar. É, aliás, na imolação
de si própria que a criatura encontra o mais seguro meio de se engrandecer e de
se depurar.
A honestidade é a essência do homem moral; é desgraçado
aquele que daí se afastar. O homem honesto faz o bem pelo bem, sem procurar
aprovação nem recompensa. Desconhecendo o ódio e a vingança, esquece as ofensas
e perdoa aos seus inimigos. É benévolo para com todos, protetor para com os
humildes. Em cada ser humano vê um irmão, seja qual for seu país, seja qual for
sua fé. Tolerante, ele sabe respeitar as crenças sinceras, desculpa as faltas
dos outros, sabe realçar-lhes as qualidades; jamais é maledicente. Usa com moderação
dos bens que a vida lhe concede, consagra-os ao melhoramento social e, quando
na pobreza, de ninguém tem inveja ou ciúme.
A honestidade perante o mundo nem sempre é honestidade
de acordo com as leis divinas. A opinião pública, é certo, tem seu valor; torna
mais suave a prática do bem, mas não devemos considerá-la infalível. Sem dúvida
que o sábio não a desdenha; mas, quando é injusta ou insuficiente, ele também
sabe caminhar avante e calcula o seu dever por uma medida mais exata. O mérito
e a virtude são algumas vezes desconhecidos na Terra; as apreciações da
sociedade quase sempre são influenciadas por paixões e interesses materiais.
Antes de tudo, o homem honesto busca o julgamento e o aplauso da sua própria
consciência.
Aquele que soube compreender todo o alcance moral da filosofia maçônica, e inclusive, a espírita tem do dever uma concepção ainda mais elevada. Está ciente
de que a responsabilidade é correlativa ao saber, que a posse dos segredos transcendentais impõe-lhe a obrigação de trabalhar com energia para o seu próprio
melhoramento e para o de seus irmãos.
As vozes dos Espíritos têm feito vibrar ecos em si, têm
despertado forças que jazem entorpecidas na maior parte dos homens e que o impelem
poderosamente na sua marcha ascensional. Torna-se o ludíbrio dos maus, porque
um nobre ideal o anima e atormenta ao mesmo tempo; mas, ainda assim, ele não o
trocaria por todos os tesouros de um império. A prática da caridade então lhe é
fácil; ensina-o a desenvolver sua sensibilidade e suas qualidades afetivas.
Compassivo e bom, ele sente todos os males da Humanidade, quer derramar por
seus companheiros de infortúnio as esperanças que o sustêm, desejaria enxugar
todas as lágrimas, curar todas as feridas, extinguir todas as dores.
A prática constante do dever leva-nos ao aperfeiçoamento.
Para apressá-lo, convém que estudemos primeiramente a nós mesmos, com atenção,
e submetamos os nossos atos a um exame escrupuloso, porque ninguém pode
remediar o mal sem antes o conhecer.
Podemos estudar-nos em outros homens. Se algum vício, algum
defeito terrível em outrem nos impressiona, procuremos ver com cuidado se
existe em nós germe idêntico; e, se o descobrirmos, empenhemo-nos pelo
arrancar.
Consideremos nossa alma pela sua realidade, isto é,
como obra admirável, porém imperfeita e que, por isso mesmo, temos o dever de
embelezar e ornar incessantemente. Esse sentimento da nossa imperfeição
tornar-nos-á mais modestos, afastará de nós a presunção, a tola vaidade.
Submetamo-nos a uma disciplina rigorosa. Assim como ao
arbusto se dá a forma e a direção convenientes, assim também devemos regular as
tendências do nosso ser moral. O hábito do bem facilita a sua prática. Só os
primeiros esforços são penosos; por isso, e antes de tudo, aprendamos a
dominar-nos. As primeiras impressões são fugitivas e volúveis; a vontade é o
fundo sólido da alma. Saibamos governar a nossa vontade, assenhorear-nos dessas
impressões, e jamais nos deixemos dominar por elas.
O homem não deve isolar-se de seus semelhantes. Convém,
entretanto, escolher suas relações, seus amigos, empenhar-se por viver num meio
honesto e puro, onde só reinem boas influências.
Evitemos as conversas frívolas, os assuntos ociosos,
que conduzem à maledicência. Digamos sempre a verdade, quaisquer possam ser os
resultados. Retemperemo-nos freqüentemente no estudo e no recolhimento, porque
assim a alma encontra novas forças e novas luzes. Possamos dizer, ao fim de
cada dia: Fiz hoje obra útil, alcancei alguma vantagem sobre mim mesmo,
assisti, consolei desgraçados, esclareci meus irmãos, trabalhei por torná-los
melhores; tenho cumprido o meu dever!
Texto extraído e editado para o blog, do livro: Depois da Morte, Léon Denis.
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